- ReproduçãoCriadores do "barulhaço", Fabrício, de 21 anos, Gopala, de 19, e Rodrigo, de 23, dizem não temer críticas por sua posição política: "A gente tá doido para conhecer Havana"
A história se repete:
em 2013, estudantes levam mais de um milhão às ruas, pedindo "passe
livre" no transporte. Dois anos depois, jovens liberais organizam
grandes protestos e "panelaços" pelo impeachment da presidente Dilma
Rousseff.
Agora, três universitários mobilizam mais de 50 mil pessoas para o que chamam de "barulhaço" - protesto marcado para ocorrer durante o discurso em cadeia nacional de Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, na noite desta sexta-feira.
Mas se os três grupos se assemelham pela pouca idade e pelo poder de mobilização nas redes sociais e ruas, se afastam nos objetivos políticos.
Criadores do "barulhaço", o estudante de direito Rodrigo Veloso, de 23 anos, e os alunos de ciências sociais Gopala Miron, de 19, Fabrício Mangue, de 21, têm como alvos os líderes do Congresso - e lembram o discurso dos apoiadores do partido espanhol Podemos e do grego Syriza, que hoje administra a maior crise econômica da história do país.
Agora, três universitários mobilizam mais de 50 mil pessoas para o que chamam de "barulhaço" - protesto marcado para ocorrer durante o discurso em cadeia nacional de Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, na noite desta sexta-feira.
Mas se os três grupos se assemelham pela pouca idade e pelo poder de mobilização nas redes sociais e ruas, se afastam nos objetivos políticos.
Criadores do "barulhaço", o estudante de direito Rodrigo Veloso, de 23 anos, e os alunos de ciências sociais Gopala Miron, de 19, Fabrício Mangue, de 21, têm como alvos os líderes do Congresso - e lembram o discurso dos apoiadores do partido espanhol Podemos e do grego Syriza, que hoje administra a maior crise econômica da história do país.
Em entrevista por telefone à BBC Brasil, reunidos em um apartamento em
Laranjeiras, no Rio de Janeiro, os jovens criticam medidas de
austeridade, atacam a relação entre empresas e políticos e se
classificam "à esquerda" - tanto da oposição, quanto do governo.
Apesar das críticas a ambos os lados, eles dizem que não apoiaram as manifestações contra a presidente e afirmam não ver contradição. "O governo está colhendo o que plantou com os aliados que escolheu", dizem. "Podemos não concordar com os dois (Cunha e Dilma), mas sabemos que não são iguais."
Seu evento no Facebook já foi visto por 1,6 milhão de pessoas e reúne, até o fechamento desta reportagem, 52 mil adesões. Entre os apoiadores estão movimentos sociais contrários à redução da maioridade penal e ao racismo, feministas, LGBTs e militantes de partidos de esquerda.
"Queremos manter o movimento suprapartidário", diz Veloso, que afirma ser financiado apenas pela "bolsa do estágio". "Nenhum partido ou corrente deles nos apoia diretamente, mas há certamente militantes do PT, do PCdoB, do PSTU, do PSOL e do PCB."
"Tem pessoas de direita e até eleitores do Aécio, é bom dizer. Alguns simplesmente não gostam do Cunha, por um ou outro motivo", afirma.
Organizadores dizem que evento tem apoio também de "pessoas de direita" e eleitores de Aécio Neves, do PSDB
Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
BBC Brasil: A manifestação repete a estratégia de outros grupos com perfil político distinto nos pronunciamentos de Dilma Rousseff. Por que "barulhaço", e não panelaço?
Começamos o evento com panelaço, mas tivemos uma reação grande de quem não concordou com o panelaço anterior.
O barulhaço é uma maneira de ironizar a indignação seletiva (críticas ao PT e não a outros investigados por corrupção) e agregar um público maior. Eduardo Cunha lidera uma pauta reacionária no Congresso e são as pessoas que não concordam com ele que queremos reunir.
Mas Cunha diz que a aprovação à redução da maioridade penal (87% da população, segundo o Datafolha) mostra que seu mandato atende à "vontade do povo".
Quando Eduardo Cunha diz que representa a maioria, ele se refere ao censo comum disseminado por "Datenas" e outros programas de TV, sem uma discussão aprofundada. Quando foi votado o financiamento privado de campanhas, 74% da população, segundo o Datafolha, eram contra.
E ele foi o principal líder do Congresso desta aprovação, inclusive colocando o financiamento empresarial na Constituição. Vemos como hipocrisia, é uma maioria que ele representa "às vezes".
O deputado também argumenta que o Congresso "nunca foi tão ativo e aprovou tantas pautas urgentes", e dá como exemplo a lei da terceirização.
O que importa não é a quantidade de matérias aprovadas, mas se o Congresso está aprovando aquilo que interessa para o país avançar na ampliação de direitos, e não em sua restrição.
Se o Congresso está trabalhando para aumentar a opressão sobre grupos marginalizados, a pauta não nos interessa.
Como avaliam o governo Dilma Rousseff?
Fazemos oposição de esquerda. Houve frustração em relação às promessas que ela fez na campanha e ao governo que deu a mão a banqueiros, ao agronegócio, à "igreja do bispo Macedo".
Mas o que está acontecendo é fruto das escolhas que o governo fez. Dilma fez campanha para (os peemedebistas) Eduardo Paes e Eduardo Cunha no Rio de Janeiro. Então o governo está colhendo o que plantou com os aliados que escolheu.
Participaram do panelaço contra ela?
Não.
Vocês são críticos a Cunha e mobilizam a população em prol desta percepção, e são críticos à presidente, sem investir a mesma energia. Por quê?
Vemos no Cunha uma barreira maior para as reformas populares que defendemos: ampliação dos direitos LGBT e das mulheres, descriminalização da maconha e do aborto, Estado laico e sua preservação. A gente pode não concordar com os dois, mas sabe que não são iguais.
Dilma foi guerrilheira, esteve ao lado das lutas populares, Eduardo Cunha começou como tesoureiro do Collor. Enxergamos os dois como (nossos) adversários, mas não como adversários iguais.
Como vocês financiam esta mobilização?
O único financiamento que a gente tem é o dinheiro dos nossos estágios. E é bem pouco.
Os atos contra a presidente têm sido puxados por três grupos principais - Vem Pra Rua, Revoltados Online e Movimento Brasil Livre. Que acham deles?
Que eles não se dispuseram a diálogo com grupos mais marginalizados da sociedade. São grupos mais conservadores, contra transformações na sociedade. Não são grupos com os quais temos pretensão de nos misturar.
Vocês são tão jovens quanto os membros do MBL. Como notam este protagonismo jovem, à esquerda e à direita?
Nossa geração nasceu depois da redemocratização do país. Nascemos no modelo de presidencialismo de coalização e esse modelo agora está sendo contestado. Nossa geração esteve junta naquela pluralidade de um milhão nas ruas em 2013, e agora cada qual está defendendo a direção que quer dar o país, com perspectivas diferentes.
Cunha tem defendido o parlamentarismo publicamente. Como veem a proposta?
Com muita surpresa, porque o parlamentarismo foi alvo de consulta pública no Brasil três vezes e foi rejeitado em todas. Não vemos por que uma quarta consulta, num momento em que os líderes do Congresso e do Senado são investigados pela operação Lava Jato. Eduardo Cunha responde a mais de 20 processos na Justiça, então como ele poderia representar o modelo ideal de governabilidade?
Impeachment e cassação: qual opinião de vocês?
Para haver impeachment tem que haver processo. Se houver uma imputação muito clara, bem embasada, e um processo com direito à ampla defesa, como o Estado de Direito exige, aí vamos tomar uma posição. Mas opinar sobre impeachment sem crime não faz sentido. Temos mais motivos para apoiar no caso daqueles que já foram indiciados na Lava Jato, como Eduardo Cunha.
A adesão aos protestos contra Dilma Rousseff foi maior que a adesão aos favoráveis. A esquerda tem mais dificuldade de articulação?
A direita tem canais de televisão, jornais, revistas. A gente tem uma parcela limitada - a internet, pequenas revistas e canais de comunicação. Por isso defendemos democratização da mídia e o fim dos monopólios: hoje eles têm uma capacidade assimétrica de defender seus interesses.
O barulhaço vai ter a mesma repercussão dos panelaços?
Acho que sim. Vimos uma adesão restrita aos eleitores de Aécio Neves nos panelaços, e os opositores do governo os usaram como se tivessem sido grandes manifestações nacionais - o que não foram. O nosso deve se assemelhar, a gente pode talvez não conseguir um grande movimento nacional, mas milhares de pessoas vão participar.
Vocês serão considerados "bolivarianos" por muita gente, que dirá para "irem para Cuba". Têm resposta?
Eu vou dizer que adoraria ir para o Caribe. É só emitir a passagem que a gente vai! A gente tá doido para conhecer Havana.
Apesar das críticas a ambos os lados, eles dizem que não apoiaram as manifestações contra a presidente e afirmam não ver contradição. "O governo está colhendo o que plantou com os aliados que escolheu", dizem. "Podemos não concordar com os dois (Cunha e Dilma), mas sabemos que não são iguais."
Seu evento no Facebook já foi visto por 1,6 milhão de pessoas e reúne, até o fechamento desta reportagem, 52 mil adesões. Entre os apoiadores estão movimentos sociais contrários à redução da maioridade penal e ao racismo, feministas, LGBTs e militantes de partidos de esquerda.
"Queremos manter o movimento suprapartidário", diz Veloso, que afirma ser financiado apenas pela "bolsa do estágio". "Nenhum partido ou corrente deles nos apoia diretamente, mas há certamente militantes do PT, do PCdoB, do PSTU, do PSOL e do PCB."
"Tem pessoas de direita e até eleitores do Aécio, é bom dizer. Alguns simplesmente não gostam do Cunha, por um ou outro motivo", afirma.
Organizadores dizem que evento tem apoio também de "pessoas de direita" e eleitores de Aécio Neves, do PSDB
Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
BBC Brasil: A manifestação repete a estratégia de outros grupos com perfil político distinto nos pronunciamentos de Dilma Rousseff. Por que "barulhaço", e não panelaço?
Começamos o evento com panelaço, mas tivemos uma reação grande de quem não concordou com o panelaço anterior.
O barulhaço é uma maneira de ironizar a indignação seletiva (críticas ao PT e não a outros investigados por corrupção) e agregar um público maior. Eduardo Cunha lidera uma pauta reacionária no Congresso e são as pessoas que não concordam com ele que queremos reunir.
Mas Cunha diz que a aprovação à redução da maioridade penal (87% da população, segundo o Datafolha) mostra que seu mandato atende à "vontade do povo".
Quando Eduardo Cunha diz que representa a maioria, ele se refere ao censo comum disseminado por "Datenas" e outros programas de TV, sem uma discussão aprofundada. Quando foi votado o financiamento privado de campanhas, 74% da população, segundo o Datafolha, eram contra.
E ele foi o principal líder do Congresso desta aprovação, inclusive colocando o financiamento empresarial na Constituição. Vemos como hipocrisia, é uma maioria que ele representa "às vezes".
O deputado também argumenta que o Congresso "nunca foi tão ativo e aprovou tantas pautas urgentes", e dá como exemplo a lei da terceirização.
O que importa não é a quantidade de matérias aprovadas, mas se o Congresso está aprovando aquilo que interessa para o país avançar na ampliação de direitos, e não em sua restrição.
Se o Congresso está trabalhando para aumentar a opressão sobre grupos marginalizados, a pauta não nos interessa.
Como avaliam o governo Dilma Rousseff?
Fazemos oposição de esquerda. Houve frustração em relação às promessas que ela fez na campanha e ao governo que deu a mão a banqueiros, ao agronegócio, à "igreja do bispo Macedo".
Mas o que está acontecendo é fruto das escolhas que o governo fez. Dilma fez campanha para (os peemedebistas) Eduardo Paes e Eduardo Cunha no Rio de Janeiro. Então o governo está colhendo o que plantou com os aliados que escolheu.
Participaram do panelaço contra ela?
Não.
Vocês são críticos a Cunha e mobilizam a população em prol desta percepção, e são críticos à presidente, sem investir a mesma energia. Por quê?
Vemos no Cunha uma barreira maior para as reformas populares que defendemos: ampliação dos direitos LGBT e das mulheres, descriminalização da maconha e do aborto, Estado laico e sua preservação. A gente pode não concordar com os dois, mas sabe que não são iguais.
Dilma foi guerrilheira, esteve ao lado das lutas populares, Eduardo Cunha começou como tesoureiro do Collor. Enxergamos os dois como (nossos) adversários, mas não como adversários iguais.
Como vocês financiam esta mobilização?
O único financiamento que a gente tem é o dinheiro dos nossos estágios. E é bem pouco.
Os atos contra a presidente têm sido puxados por três grupos principais - Vem Pra Rua, Revoltados Online e Movimento Brasil Livre. Que acham deles?
Que eles não se dispuseram a diálogo com grupos mais marginalizados da sociedade. São grupos mais conservadores, contra transformações na sociedade. Não são grupos com os quais temos pretensão de nos misturar.
Vocês são tão jovens quanto os membros do MBL. Como notam este protagonismo jovem, à esquerda e à direita?
Nossa geração nasceu depois da redemocratização do país. Nascemos no modelo de presidencialismo de coalização e esse modelo agora está sendo contestado. Nossa geração esteve junta naquela pluralidade de um milhão nas ruas em 2013, e agora cada qual está defendendo a direção que quer dar o país, com perspectivas diferentes.
Cunha tem defendido o parlamentarismo publicamente. Como veem a proposta?
Com muita surpresa, porque o parlamentarismo foi alvo de consulta pública no Brasil três vezes e foi rejeitado em todas. Não vemos por que uma quarta consulta, num momento em que os líderes do Congresso e do Senado são investigados pela operação Lava Jato. Eduardo Cunha responde a mais de 20 processos na Justiça, então como ele poderia representar o modelo ideal de governabilidade?
Impeachment e cassação: qual opinião de vocês?
Para haver impeachment tem que haver processo. Se houver uma imputação muito clara, bem embasada, e um processo com direito à ampla defesa, como o Estado de Direito exige, aí vamos tomar uma posição. Mas opinar sobre impeachment sem crime não faz sentido. Temos mais motivos para apoiar no caso daqueles que já foram indiciados na Lava Jato, como Eduardo Cunha.
A adesão aos protestos contra Dilma Rousseff foi maior que a adesão aos favoráveis. A esquerda tem mais dificuldade de articulação?
A direita tem canais de televisão, jornais, revistas. A gente tem uma parcela limitada - a internet, pequenas revistas e canais de comunicação. Por isso defendemos democratização da mídia e o fim dos monopólios: hoje eles têm uma capacidade assimétrica de defender seus interesses.
O barulhaço vai ter a mesma repercussão dos panelaços?
Acho que sim. Vimos uma adesão restrita aos eleitores de Aécio Neves nos panelaços, e os opositores do governo os usaram como se tivessem sido grandes manifestações nacionais - o que não foram. O nosso deve se assemelhar, a gente pode talvez não conseguir um grande movimento nacional, mas milhares de pessoas vão participar.
Vocês serão considerados "bolivarianos" por muita gente, que dirá para "irem para Cuba". Têm resposta?
Eu vou dizer que adoraria ir para o Caribe. É só emitir a passagem que a gente vai! A gente tá doido para conhecer Havana.
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