A manobra depende da existência de um clima de inquietação, com a economia em queda e o desemprego em alta
Elio Gaspari, O Globo
A repórter Raquel Ulhoa avisou: arma-se no Congresso um golpe para
mutilar a Presidência da República estabelecendo um regime
parlamentarista. Numa ponta dessa conversa, para logo, já se viu o
senador Renan Calheiros. Noutra, defendendo a ideia para mais adiante,
entrou o deputado Eduardo Cunha. Pairando sobre ambos há uma parte do
tucanato, desencantada com as bandeiras do impedimento, das contas do
TCU e dos processos do Tribunal Superior Eleitoral.
A manobra depende da existência de um clima de inquietação, com a
economia em queda e o desemprego em alta. Disso, a doutora vem cuidando.
Para piorar, o Congresso aprova maluquices que agravam as dificuldades.
O caldo entornará com as manifestações de agosto (desprezando-se a
possibilidade de surgimento de manifestantes contra golpes, ladroagens e
truques dos suspeitos de sempre).
O parlamentarismo pode ser instituído com a aprovação por maioria de
três quintos das duas Casas do Congresso, em duas votações. São
necessários 51 dos 81 senadores e 308 dos 513 deputados. Isso só se
consegue com uma crise do tamanho da de 1961, quando o país esteve à
beira da guerra civil, e aprovou-se uma emenda parlamentarista,
mutilando o mandato de João Goulart.
É muito comum ouvir-se falar em “golpe paraguaio” ou “golpe boliviano”.
A manobra criaria o “golpe brasileiro”, superando de longe os dois
outros. O parlamentarismo foi rejeitado pela população em dois
plebiscitos, sempre por larga maioria. O primeiro deu-se em 1963, e o
segundo, em 1993. Nele, o regime parlamentar teve 16,5 milhões de votos,
contra 37,2 milhões dados ao presidencialismo. O restabelecimento da
monarquia teve 6,8 milhões.
De acordo com o processo legislativo e a Constituição, seria mais fácil
revogar a Lei Áurea, sancionada a partir de um simples projeto de lei
votado pelos deputados e senadores. Ela nunca foi submetida a um
referendo, quanto mais a dois. A velha e boa plutocracia nacional deve
reconhecer que essa mágica é impossível, mas ela haveria de lhe fazer o
gosto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
POLÍTICA E ECONOMIA