BRASÍLIA - Brasília vive a progressiva inserção no quadro que
representa o inferno no esplêndido tríptico "O Jardim das Delícias
Terrenas", de Bosch. Tudo está escuro e pesado, matizado apenas por
lampejos oriundos do lume de regiões inferiores.
É nessas nesgas de luz trevosa que se encontram as pistas do que espera o
mundo político. O rompimento de Eduardo Cunha com o governo, de fato,
já que de direito o é desde sempre, abre para o Planalto um portal
infernal imprevisível.
Até aqui, Cunha manobrava entre estocadas e concessões ao governo, em
oposição ao comportamento agressivo do seu companheiro na chefia do
Senado, Renan Calheiros. Agora, Dilma tem dois dos três próceres do PMDB
contra si; o terceiro, seu vice Michel Temer, está constitucionalmente
ao seu lado, por ora.
Note-se que não trato aqui de culpas. Politicamente, Cunha sofreu um
baque com a acusação de propina na Lava Jato, que o colocou na
defensiva. Até agora, está falando virtualmente sozinho, mas não contem
com isso de forma indeterminada.
Fosse outro governo, cairia com relativa facilidade –lembrem de Severino
Cavalcanti e seu "mensalinho", Renan e seus rolos anteriores.
Mas falamos de Cunha, cuja sagacidade garantirá tom épico a qualquer
embate. E, principalmente, da gestão natimorta de Dilma 2, que se
arrasta tal e qual zumbi de cinema.
Soa prematura a comemoração palaciana das agruras do deputado, como se
um ano e meio de infortúnios sobre PT e governo, fora TCU, TSE e Lula
sob inédita investigação, fossem apagados do nada. Cunha ainda tem muito
capital político para queimar, ao contrário de Dilma.
O enredo é complexo, e tem na Procuradoria-Geral da República ator
central para determinar a velocidade da crise daqui em diante.
Institucionalmente, claro, é tudo uma tragédia sem fim e de uma
opacidade desalentadora. O cenário não inspira esperança para o país.
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POLÍTICA E ECONOMIA