sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Dilma tenta pacto com o demônio para salvar governo, diz FHC

Brasil em crise

Ernesto Rodrigues - 23.set.15/Folhapress

São Paulo - SP - Brasil -23/09/2015 : FERNANDO HENRIQUE CARDOSO : Entrevista com o ex- presidente Fernando Henrique Cardoso no instituto FHC na capital paulista. ( Foto Ernesto Rodrigues/PODER). cod.0628.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em sua sala no Instituto FHC

25/09/2015 02h00

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) acha que a presidente Dilma Rousseff fez um "pacto com o demônio" para tentar salvar seu governo ao oferecer novas posições no ministério ao PMDB, seu maior aliado.

"Vai governar como? Não vai. Vai ser governada", diz o líder tucano. Na sua avaliação, a crise só será superada se as forças políticas encontrarem meios de conter a expansão dos gastos públicos e reformar o sistema político.

Fernando Henrique sugere que Dilma convoque os adversários para debater um pacto em torno das reformas necessárias e ofereça sua renúncia antes do fim do mandato como garantia de que se empenhará para aprová-las.

"O tempo dela está se esgotando", diz FHC. Para ele, os defensores do impeachment ainda não encontraram uma "narrativa convincente" para abrir na Câmara dos Deputados o processo que permitiria afastar Dilma do cargo.


O ex-presidente disse ainda que a crise política fará o PT encolher nos próximos anos, mas, em sua avaliação, o partido seguirá ocupando espaço relevante na política brasileira.

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Folha - A cúpula do PMDB se distancia da presidente e os deputados negociam posições no ministério. O que significa?

Fernando Henrique - Em épocas de incerteza, é natural que os partidos fiquem oscilantes. O PMDB indica duas direções. Uns acham que vale a pena manter o governo. E há os que desconfiam que não dá mais. Isso vai continuar por muito tempo, até que se sinta que há mais clareza sobre o passo seguinte, seja do governo, seja dos que querem mudar o governo.

O que falta para as principais forças políticas se definirem?

A presidente Dilma está num dilema grande. Ao nomear o [ministro da Fazenda, Joaquim] Levy, deu um sinal de que entendeu que o caminho que havia pego estava errado. Mas esse sinal não é convincente, e isso se reflete em tudo. Nosso sistema é presidencialista, mas muito dependente da capacidade do governo de formar maioria no Congresso. Ela não mostrou ainda que tem essa maioria.

A oposição tem os votos necessários para abrir um processo de impeachment hoje?

O impeachment depende de você ter uma argumentação convincente, não só para o Congresso, mas para o povo. Os que desejam o impeachment não construíram até hoje uma narrativa convincente. Pega as pedaladas. Você pode argumentar, como juristas têm feito, que não há como caracterizar um crime.

A lei diz que precisaria ser um atentado à Constituição.
Tudo depende de interpretação. No caso das pedaladas, para que se torne convincente, tem que fazer uma ligação direta com o uso de recursos para fins eleitorais. Aí o povo entende. Enquanto não houver uma narrativa que permita justificar politicamente o impeachment, é difícil.

Mesmo se Dilma continuar com popularidade tão baixa?

Qual é a mágoa que a população tem da presidente? Ela ter dito uma coisa [na campanha] e fazer outra [no governo]. O que a salva em certos setores da opinião, o ajuste econômico, é o que a condena diante de outros.

No sistema parlamentarista, a perda da maioria no Congresso levaria à queda do governo. No presidencialista, não tem como fazer isso, a não ser por um processo mais violento, que é o impeachment.

O problema é a angústia do tempo. É tanto desacerto que surgiu uma grande inquietação. Se fosse por um ano, haveria a expectativa de uma mudança que estaria ao alcance. Como você não tem essa expectativa, a inquietação gera essas ideias para arranjar um modo de nos desvencilharmos da presidente.

O afastamento de Dilma seria suficiente para resolver isso?

A questão não é só a presidente. Temos um sistema partidário e eleitoral que tornou inviável construir maiorias sólidas no Congresso. Você tem 30 e poucos partidos, e a maioria está aí para disputar pedaços do poder, do orçamento. Qualquer um terá esse problema para governar.
O sr. defendeu outro dia a formação de um novo "bloco de poder" como solução para a crise política. O que falta?
Se estivesse no lugar da presidente Dilma... Eu perdi popularidade em mais de um momento, recuperei, perdi de novo, mas nunca perdi a maioria no Congresso, o respeito. É difícil imaginar, mas fui presidente, sei como é.

Ela teria uma saída histórica. Apresentar-se como coordenadora de um verdadeiro pacto. Em que não estivesse pensando em vantagens para seu grupo político, só no futuro do país, e propondo que o conjunto das forças políticas se unisse para fazer algumas coisas. Modificar o sistema eleitoral. Conter a expansão do gasto público. Reformar a Previdência. E ofereceria o seguinte: aprovado esse pacto, em um ano ela renunciaria. É utópico isso, eu sei.

Uma renúncia negociada?

Negociada em nome de objetivos políticos que não são do interesse do meu partido, de nenhum partido. Aí você segura a ânsia [das outras forças] de chegar ao governo.

O tempo dela está se esgotando. Ela tem que olhar para a história. Não convém ficar marcada como a presidente que não conseguiu governar. Ou que vendeu a alma ao diabo para governar. Agora, ofereceu cinco ministérios ao PMDB. Vai governar como? Não vai. Vai ser governada.

Em caso de renúncia, o vice Michel Temer assume o governo.

A posse do vice não resolveria. Precisa realmente ter uma nova configuração. Mas não adianta uma nova configuração com regras antigas.

Dilma pode continuar a governar. Vai fazer pacto com o demônio o tempo todo. Vai ter que ceder cada vez mais. E o governo ficará mais contraditório. Na Fazenda, o que se requer é um ajuste. E isso é contraditório com os interesses dos grupos políticos que vão para o poder, porque eles querem estar lá para fazer coisas. E não vão poder fazer.

Então, vai ser um governo complicado, confuso. Pode? Se tivesse um ano só... Mas são três anos. É uma longa caminhada, de incertezas.

E a saída pelo impeachment?

Se houver alguma coisa que seja clara para a população, pode ser. Suponha que nos processos na Justiça Eleitoral se demonstre de forma inequívoca que houve dinheiro do petrolão na campanha. O que o juiz vai fazer? Aí não tem jeito, tem a lei.

Nesse caso, Dilma e Temer seriam cassados juntos.

A chapa inteira. Seria uma solução? Uma confusão enorme também. Porque os problemas estão aí. Não resolvemos nada, nem na política, nem na parte de gerência do Estado. Se não tiver uma perspectiva de reorganização das contas públicas, e do sistema político, não tem solução.

Como têm sido as conversas do PSDB com Michel Temer?

Quem pode dar as cartas hoje no jogo é o PMDB. Dilma pode ficar no feijão com arroz, ou fazer um gesto de grandeza. O mais provável é que continuará no feijão com arroz. O PMDB pode construir uma saída constitucional.

O PSDB se confrontará com outra questão. Vai ajudar, ou não? Se houver razão concreta, narrativa convincente, votará pelo impeachment. Mas e depois? Os problemas não vão mudar porque mudou o presidente. Precisa ter um sentido, um rumo. Aí o PSDB vai ter que cobrar esse rumo. 


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