Fabio Teixeira/Folhapress | ||
Catador instala TV de plasma de 43 polegadas e aparelho de DVD em carroça no Rio de Janeiro |
Às 15h da tarde de segunda-feira (3), os pedestres do centro do Rio
apressam o passo até a próxima esquina ou desviam de algum motoqueiro
com sua insistente buzina.
Sem camisa, deitado sobre seu carrinho de carreto, Elias Vieira, 42,
quer apenas programar sua nova TV de 43 polegadas. Com um cigarro na mão
esquerda e um controle remoto na direita, logo se anima quando alguém
mostra interesse por sua invenção.
Conhecido entre os carroceiros como "burro sem rabo", o carrinho de
ferro sobre rodas ganhou novos itens de série na mão do artista.
Além da TV de plasma, ele instalou uma antena HD, um ventilador, um
aparelho de DVD, um notebook, três amplificadores e um potente conjunto
de alto-falantes.
"Modelo Tornado 4000 JBL, da Selenium", faz questão de deixar claro. "Só
não vou colocar no volume máximo porque senão vai tremer tudo aqui e os
escritórios do lado vão começar a reclamar."
Além de servir para o transporte de cargas e de distração para Elias, o carrinho tem outras funções.
Quando o fim do expediente chega aos escritórios e as gravatas são
afrouxadas nos happy-hours dos bares da Cinelândia, Elias também muda de
profissão e vira DJ.
Ele para o carrinho em frente a um bar que não tenha som, toca músicas
e, depois de alguns minutos, pede a contribuição dos clientes. O
repertório, baseado em sucessos do hip-hop americano da última década,
tem nomes como Beyoncé e os cantores Usher e 50 Cent.
"Todo mundo o conhece aqui no centro", diz Rivaildo, funcionário do
Metrô. "Gosto mesmo quando ele toca um charme", diz referindo-se ao
estilo musical semelhante ao funk, com batida mais lenta.
"Na Copa, ganhei uma nota aqui", gaba-se Elias. Ele ligava sua TV e os
pedestres que ainda estavam no centro da cidade se reuniam para assistir
ao jogo com ele.
"Quando dava o intervalo do jogo, eu virava e falava: 'o jogo está
legal, né? Agora, vamos contribuir, nem que seja com 10 centavos,
pessoal'. Aí os caras davam R$1, R$5."
Com o passar das horas e a chegada da noite, os executivos já estão
cansados dos colarinhos de suas cervejas. Nesse momento, o trabalho de
DJ já não encontra mais plateia e o carrinho de Elias vira também a sua
cama.
"Levo o carrinho para um estacionamento onde durmo há 30 anos."
TRABALHO
Desde que "se entende por gente", Elias esteve zanzando por entre as
ruas do centro do Rio, próximo aos suntuosos prédios do Theatro
Municipal e da igreja do Carmo.
"Dos amigos dessa época, só 10% seguiram meu caminho, o do trabalho".
Segundo Elias, todos seu amigos de infância, morreram ou se envolveram
com crimes e drogas. "E meu único vício é esse aqui", diz sacando do
bolso um cigarro tipo light.
Ainda menino, enquanto buscava na rua qualquer material que pudesse lhe
render algum trocado, achou um livro sobre os segredos ocultos dos
eletroeletrônicos. Ele, que nunca pisou numa escola, aprendeu a
consertar pequenos aparelhos.
Há 20 anos, o carrinho que havia comprado para fazer carreto começou a
ganhar feições de lar. "Fui mudando uma coisinha aqui e outra ali e
nunca mais parei", diz sobre o seu patrimônio.
A paixão por componentes eletrônicos o colocou em um curso
profissionalizante, há cerca de cinco anos (Elias não se recorda ao
certo).
O curso o levou para um trabalho na Zona Franca de Manaus. "Não durou
muito tempo, mas com esse dinheiro eu comprei meu barraco".
A casa de Elias foi comprada no bairro de Campo Grande, na zona oeste do
Rio, a mais de 50 km das ruas em que cresceu. "Mas eu só vou para lá de
fim de semana para descansar".
Sobre a vida corrida entre as ruas do centro e o barraco em Campo
Grande, Elias dá sua receita para não desanimar. "É só não fazer coisa
errada... Se sujeito não se perder, dá para viver bem."
FOLHA > UOL
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