Os
críticos de Dilma Rousseff podem estar sendo injustos. Talvez ela
enxergasse o combate à corrupção como uma prioridade do Brasil desde a
primeira mamada. É provável que o fim da impunidade fizesse parte de sua
agenda secreta já na época em que foi a faz-tudo do governo
Lula. Só ficou de braços cruzados durante quase 12 anos por esperteza.
Queria saber do que o PT e seus aliados eram capazes. Queria ver até
onde deixariam o melado escorrer.
Neste sábado, com o melado a
roçar-lhe o bico do sapato, Dilma detalhou na propaganda eleitoral um
pacote anti-corrupção que decidiu desembrulhar oito dias antes da
eleição. Disse que vai mandar para o Congresso um lote de projetos —um,
dois, três, quatro, cinco projetos de lei. “Representam um passo
decisivo no combate à impunidade”, disse Dilma, “pois ela é um mal do
qual a corrupção e os crimes financeiros se alimentam.”
Dilma
sonha com “processos e julgamentos mais rápidos.” Ela deseja “punições
mais duras.” Ambiciona “eliminar certos procedimentos que permitem que
processos e julgamentos atrasem indefinidamente em nosso país.” Não se
conforma com a evidência de que “os poderosos sempre encontram
trincheiras ou rotas de fuga para se proteger.” A presidente não
mencionou, talvez para não assustar as crianças, mas ainda há poderosos
entrincheirados até na Petrobras.
Desde que assumiu a Presidência,
em janeiro de 2011, Dilma vinha adotando um comportamento esquisito.
Deduz-se agora que ela apenas disfarçava seu verdadeiro intento, que
sempre foi combater a corrupção e acabar com a impunidade. Não
mencionava a intenção de enviar os projetos ao Congresso por receio de
alertar os inimigos, vários deles fantasiados de aliados. Em terra de
cego, ensina o comportamento de Dilma, quem tem um olho não revela.
Pouca
gente notou, mas Dilma já vinha operando uma profunda mudança nos
costumes políticos. Seus antecessores suavam para produzir escândalos.
Ela incorporou à sua gestão escândalos que vieram do governo Lula
prontos. No primeiro ano de sua administração, varreu da Esplanada sete
prontuários.
Um ano e meio depois da faxina, sobreveio a segunda
fase. Nela, Dilma negociou com os coroneis do lixão partidário a
retomada dos ministérios contaminados. Reabilitados, os faxinados
Alfredo Nascimento (PR) e Carlos Lupi (PDT) comandaram a reocupação dos
respectivos monturos, a pasta dos Transportes e a do Trabalho.
Na
sequência, Dilma deflagrou a terceira onda. Que subordinou o interesse
público a um projeto pessoal: a reeleição. Observadores menos atentos
imaginaram que, em vez de reformar o governo, ela tinha sido reformada.
Parou de ostentar o apreço pela moralidade. No episódio mais repugnante,
cedeu à chantagem do Partido da República, comandado pelo mensaleiro
Valdemar Costa Neto. Trocou 1min15s de propaganda pela cabeça de um
ministro.
Por quê? De repente, tudo se esclarece. Dilma tinha o
desejo inconsciente de desnudar o presidencialismo de cooptação —como
quem desvenda crimes cometendo-os. Cercou-se de auxiliares precários
para que eles deixassem as mais espantosas pistas. Tomada por uma
irresponsabilidade revolucionária, manteve o agora delator Paulo Roberto
Costa na diretoria da Petrobras até 2012 para que ele demarcasse seus
erros com cuidado, facilitando o rastreamento.
Dilma disse na
propaganda deste sábado que sempre teve “compromisso com a ética na vida
pública e com a defesa do patrimônio dos brasileiros.” Seu compromisso é
“tão sólido”, disse um locutor, “que ela levou esse tema à última
assembléia geral das Nações Unidas”, há três dias, em Nova York.
“Outro
valor fundamental é o respeito à coisa pública e o combate sem tréguas à
corrupção”, discursou Dilma, da tribuna da ONU, buscando os olhos de
João Santana. “A história mostra que só existe uma maneira correta e
eficiente de combater a corrupção: o fim da impunidade.” Se obtiver o
segundo mandato, Dilma decerto nomeará auxiliares decentes. Para
demonstrar que fala sério, deveria enviar ao olho da rua os ministros,
assessores e dirigentes da Petrobras que dão ao Brasil essa aparência
incômoda de Maranhão hipertrofiado, esse jeitão de Grande Alagoas.
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