quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Tempos difíceis


Com a proximidade das eleições, o tom da campanha começa a se elevar, e os candidatos cuidam, além de defender os seus propósitos, de desqualificar os dos adversários. Dilma, por exemplo, ataca o programa de governo apresentado por Marina Silva, taxando-o de recessivo, sem levar em conta que sua política econômica já deságua, nitidamente, em recessão técnica. Há quem, a essa altura, já sinta saudades, até mesmo, do pibinho que, há pouco, criticávamos. Ainda assim, Guido Mantega, embora já tenha recebido seu cartão vermelho, tornou-se o mais longevo de todos os ministros da Fazenda na história do país. O candidato Aécio Neves alerta que sua luta é travada contra um PT em dobro, já que as 2 candidatas a ele adversas têm a mesma origem no partido que, se um dia, viu a esperança vencer o medo, hoje se vê assaltado pelo terror de perder o poder.

Esta situação parece lembrar o tempo da ditadura militar, quando foi estabelecido o instituto da sublegenda. Em 1977, quando os partidos foram extintos, criaram-se 2 novos denominados Arena e MDB, permitindo-se a cada 1 deles apresentar mais de 1 candidato, nas eleições majoritárias. Ao final, somavam-se os votos dados às sublegendas, e a sua totalidade era atribuída ao candidato mais votado. Essa regra ajudava a Arena, ao impedir que o MDB se beneficiasse de eventuais divisões internas do partido do governo. Nessa linha de raciocínio, caso Dilma seja alijada do segundo turno, fato já admissível pelo andar da carruagem, a vitória de Marina perpetuaria o PT no poder, já que, nas palavras de Lula, ela é “uma petista de raiz”. É bem verdade que os tempos são outros, e a situação não se apresenta tão simples assim. Com a morte de Eduardo Campos, Marina – uma evangélica cuja fala tem a expressão de quem está no púlpito de um templo –, parece ter sido cooptada a ocupar o vácuo gerado pelas manifestações espontâneas de junho de 2013, personificando o perfil que habita o imaginário coletivo, ainda que o mesmo não tenha contornos claramente definidos quanto à sua natureza apartidária ou antipartidária. Junte-se a essa conotação o messianismo com que tentam atrelar sua imagem à luta de Davi contra Golias, para que tenha renascido o simbolismo de quem a identifique como a depositária do anseio generalizado da multidão, que não se sente representada pelos projetos vocalizados pelo PT ou PSDB.

Como a mutação no Brasil só ocorre ao ser disparado aquilo que Nelson Rodrigues, metaforicamente, denominava de Sobrenatural de Almeida no futebol, os escândalos que se sucedem podem, até a véspera da eleição, provocar mudanças de expectativa, fazendo com que o voto migre na mesma direção das novas ventanias e dos vendavais que as tormentas prenunciam no horizonte sombrio das delações premiadas. Paulo Roberto, o diretor da Petrobras, havia advertido: “Se eu falar, não vai haver eleição”. Para que surja um novo caos progressista em nosso meio, é preciso que sejam identificados todos os lobos que se travestem de cordeiros em nossa selva política, antes das eleições de outubro, a fim de que exorcizemos o mito de que o Brasil é o país da impunidade. Essa sequência de escândalos faz com que nós, pobres e patéticos assistentes de tantos descalabros, nos transformemos em cúmplices de seus autores e, pela inércia que nos acomete, também, em reféns com acentuados sintomas da síndrome de Estocolmo. Quem sabe, toda essa bagunça que hoje nos oprime possa adubar o terreno para o advento de um novo ciclo, através do qual consigamos plantar a versão tupiniquim da Operação Mãos Limpas, cuja dimensão propicie ampla investigação judicial, visando a esclarecer, julgar e punir, de uma vez por todas, os casos contínuos de corrupção, praticados com tanta desenvoltura nas 2 últimas décadas.

Wagner Gomes, administrador de empresas

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POLÍTICA E ECONOMIA