O recado dado pelo novo ministro da Justiça, Eugênio Aragão, à Policia Federal que trocará a equipe inteira de investigação em caso de vazamentos ilegais de informações foi classificada como uma "ameaça" pela maior associação de delegados federais.
Para o presidente da ADPF (Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal), Carlos Miguel Sobral, a fala revela que há uma intenção em acabar com a Operação Lava Jato.
"Isso demonstra duas coisas: vulnerabilidade da PF que não tem sua autonomia garantida na Constituição e na lei e outra que aparenta a pressa em acabar com a maior investigação de combate ao crime organizado da história do Brasil", criticou.
A entidade avalia até mesmo ingressar com medidas judiciais para garantir a atuação dos delegados. Segundo ele, não há indícios até agora de nenhuma ilegalidade cometida durante as investigações do esquema de corrupção na Petrobras.
"Nossa diretoria está discutindo medidas que podem sem adotadas diante das ameaça proferidas pelo ministro da Justiça", disse.
O presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), José Robalinho Cavalcanti, também reagiu à fala do ministro comparando as delações premiadas da Lava Jato a extorsão, uma vez que foram decretadas prisões preventivas para que ocorra a colaboração, perdendo o caráter da voluntariedade.
Para o procurador, Aragão, que também é integrante do Ministério Público, acabou cometendo um erro ao politizar uma questão técnica.
"O ministro escorregou ou está fazendo um discurso político ao falar em extorsão. Não há extorsão alguma. Não há delação premiada sem voluntariedade no Brasil e nem na Lava Jato", disse Robalinho Cavalcanti.
"O ministro disse que há uma politização dos agentes de Estado. Com todo respeito, ao falar em extorsão, quem está tentando politizar a Lava Jato é o ministro da Lava Jato. Todas as delações foram tomadas com voluntariedade e analisadas por um Judiciário técnico e livre", completou.
Em entrevista à Folha, Aragão disse que a equipe será mudada, mesmo que não tenha provas. Ele classificou como "extorsão" o método com que as delações premiadas são negociadas no rastro da Operação Lava Jato.
A Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) diz "que é compreensível a preocupação do novo Ministro da Justiça, Eugênio Aragão, embora isso não atinja a autonomia investigativa da Polícia Federal". Em comunicado, o presidente da Fenapef, Luís Boudens, disse esperar que o foco de Aragão em relação à PF seja o de equilibrar os ânimos internos e finalizar o processo de reestruturação da Carreira Policial Federal, iniciado na gestão anterior.
A maior investigação criminal do país atinge tanto governo como oposição, mas, principalmente, siglas da base aliada, como PT, PMDB e PP.
A declaração do ministro reforça discurso da presidente Dilma Rousseff, que tem feito duras críticas a "vazamentos seletivos" e à postura do juiz Sergio Moro.
No Congresso Nacional, a declaração do ministro foi bem recebida por governistas, mas criticada por oposicionistas.
Para petistas, a atitude do ministro é correta e demonstra que ninguém está acima da lei. Em reação contrária, tucanos temem a ameaça de intervenção no trabalho da Polícia Federal e dizem que a opinião é "desconectada" com a função de ministro da Justiça.
"Ele está correto. Vazamentos são proibidos. Nem o Ministério Publico nem a Polícia Federal estão acima da lei. Se há vazamentos ilegais, os responsáveis têm de ser no mínimo afastados", avaliou o deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), que tem feito fortes críticas à Operação Lava Jato.
Na avaliação dele, a delação premiada tem sido utilizada como uma "forma de tortura". "E é, sim, como diz o ministro, uma forma de extorsão", disse.
Em linha semelhante, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, avaliou que a postura da força-tarefa da Operação Lava Jato tem construído "um embrião do estado de exceção dentro do estado democrático de direito".
"A investigação tem de ser feita dentro da legalidade e estão atropelando a Constituição Federal", criticou. "A delação premiada tem de ser voluntária. Com as prisões preventivas, são feitas torturas para delatarem", acrescentou.
INTERVENÇÃO
Crítico ao governo federal, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) avaliou como "preocupante" o fato do ministro adotar posição contrária a um dispositivo jurídico previsto na legislação brasileira e que, segundo ele, tem ajudado a desvendar casos de corrupção.
O tucano ressaltou que não deve haver ilegalidades no vazamento de informações, mas ponderou que a afirmação do ministro sobre a Polícia Federal "faz pairar uma ameaça de intervenção" nas instituições investigativa.
Para o líder do PSDB na Câmara dos Deputados, Antonio Imbassahy (BA), a fala de Aragão "é uma manifestação desconectada com a função de ministro da Justiça".
Segundo ele, a nomeação dele traz preocupação e levanta suspeita, uma vez que Lula o chamou em gravação divulgada pela Justiça Federal de amigo.
"Eu chego até pensar o inimaginável de que seriam capazes de fazer vazar informações sigilosas para justificar uma violência contra a Polícia Federal para prejudicar a Operação Lava Jato", disse.
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