Não é nada pessoal, mas, enquanto você lê este parágrafo, tem gente em
todas as chancelarias do mundo detestando a ideia de comparecer à posse
da presidente Dilma Rousseff.
Em condições normais, seria uma alegria assistir a uma cerimônia festiva
em um país simpático. Acontece que a Constituição de 1988 estabeleceu a
data da posse presidencial em 1º de janeiro.
Ou seja, razão para essa má vontade internacional nós mesmos criamos:
quem acha graça em passar o Réveillon trabalhando, distante dos amigos e
da família?
Quando a Constituinte tomou essa decisão, pretendia que as datas do
mandato presidencial coincidissem com as do exercício fiscal, de 1/01 a
31/12.
Administrativamente, faz sentido. Do ponto de vista diplomático,
no entanto, pouca coisa é mais inconveniente.
Fazer uma cerimônia de posse coincidir com uma das datas mais festejadas
do mundo é dar tiro no próprio pé. Se fosse uma cerimônia apenas para
brasileiros, menos mau, seriam nossas idiossincrasias, os prejuízos
ficariam por aqui. Mas convidam-se praticamente todos os chefes de
Estado, que comparecem ou mandam representantes.
O legislador brasileiro parece ter esquecido que uma das funções da
posse presidencial é diplomática. Em termos de política externa, o
evento permite uma série de contatos diretos entre autoridades
governamentais de alto nível. As delegações que comparecem encontram-se
com suas contrapartes e várias sinergias se iniciam.
Também serve como laboratório para avaliar o nível de importância que os
países atribuem à relação com o Brasil. Os Estados Unidos, por exemplo,
que estão com o filme queimado depois de terem espionado o celular da
presidente, vão mandar o vice-presidente Joe Biden, em lugar da então
secretária de Estado, Hillary Clinton, que veio à posse do primeiro
mandato de Dilma.
Naquela ocasião, 23 chefes de Estado ou governo compareceram. Não é
pouca coisa, mas poderiam ser muitos mais. Países que gostariam de se
representar em nível adequado acabam não o fazendo dada a inconveniência
da data.
Impor uma posse presidencial aos países amigos no primeiro dia do ano é
um ato no mínimo inconveniente, que denota pouca noção de como se
conduzem as relações diplomáticas. Como inspirar boa vontade em alguém
que você forçou a abandonar a família durante as festas de fim de ano? É
quase convidar para piquenique na chuva. Para o empossado, trata-se de
um mau começo.
O legislador errou ao negligenciar o potencial político do evento, mas
pior que errar é persistir no erro. Existe, sob exame do Congresso, uma
PEC de autoria do senador José Sarney que propõe, entre outras, a
mudança da data da posse para 10 de janeiro. Sabe quando falam de
aperfeiçoamento democrático? Isso também faz parte.
A posse é uma cerimônia custosa aos cofres públicos. Deve ser
aproveitada em todo o seu potencial, inclusive diplomático. O Brasil
merece que o Congresso aprove a proposta de emenda à Constituição
prontamente e que Dilma Rousseff seja o último presidente brasileiro
empossado na ressaca do Réveillon.
FOLHA > alexandre vidal porto
Nenhum comentário:
Postar um comentário
POLÍTICA E ECONOMIA