RUBENS VALENTE
12/01/2016 01h30
O ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró afirmou,
em delação premiada, que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva
deu-lhe um cargo público em 2008 como "reconhecimento" pela ajuda que
ele prestou para quitar um empréstimo de R$ 12 milhões considerado
fraudulento pela Operação Lava Jato.
É a primeira vez que um delator do caso envolve Lula diretamente no episódio.
Em 2004, o fazendeiro José Carlos Bumlai
obteve empréstimo do Banco Schahin e diz ter repassado R$ 6 milhões
para o empresário de Santo André (SP) Ronan Maria Pinto, que, segundo a
Lava Jato, detinha informações comprometedoras sobre o PT na região.
Anos depois, sob o comando de Nestor Cerveró, a diretoria Internacional da Petrobras aceitou contratar a Schahin Engenharia por US$ 1,6 bilhão para a operação de um navio-sonda, o Vitoria 10.000.
Segundo as investigações, o contrato seria uma forma de o PT retribuir o grupo Schahin pelo empréstimo.
Cerveró ficou na diretoria entre 2003 e 2008, e em seguida, foi nomeado
diretor financeiro e de serviços de uma subsidiária da estatal
petroleira, a BR Distribuidora.
O delator contou que Lula "decidiu indicar" seu nome para o novo cargo
"como reconhecimento da ajuda do declarante [Cerveró]", ou seja, por ele
"ter viabilizado a contratação da Schahin como operadora da sonda". A
atuação também rendeu a Cerveró "um sentimento de gratidão do PT".
No termo de colaboração, não consta que Cerveró tenha sido indagado
diretamente pelos investigadores se Lula sabia da finalidade do
empréstimo concedido pela Schahin ou do sistema de "quitação" da dívida
por meio do navio-sonda.
Em seu depoimento, Bumlai admitiu que o empréstimo contraído no Banco
Schahin foi usado para quitar dívidas do PT, mas isentou Lula de
participação no negócio. O empréstimo, disse o pecuarista, nunca foi
pago. A contratação do navio-sonda implicou no pagamento de propina
estimada em US$ 25 milhões a funcionários da Petrobras, políticos e
lobistas.
No mesmo depoimento, de 7 de dezembro, Cerveró também afirmou que Lula
atribuiu ao então senador José Eduardo Dutra (PT-SE) "missão de
participar do 'esvaziamento' da CPI da Petrobras" instalada no Congresso
em 2009.
Dutra, morto em outubro passado, tinha "facilidade de diálogo, inclusive
com a oposição", segundo Cerveró. Dutra havia sido presidente da
Petrobras, e deixara a chefia da BR Distribuidora em 2009. O argumento
para a saída divulgado na época foi sua candidatura à presidência do PT.
Ele foi escolhido para presidir sigla a partir de 2010.
COLLOR
Cerveró, no depoimento, também atribuiu a Lula decisão de ter "concedido
influência sobre a BR Distribuidora" ao senador e ex-presidente
Fernando Collor (PTB-AL). Poder semelhante teria sido dado ao alagoano
pela presidente Dilma Rousseff, conforme o delator alegou ter ouvido do
senador.
Segundo Cerveró, por volta de setembro de 2013 ele foi chamado a
Brasília para uma reunião com Collor na Casa da Dinda, residência do
senador. Na ocasião, o senador disse ter falado com Dilma, "a qual teria
dito que estavam à disposição de Fernando Collor a presidência e todas
as diretorias da BR Distribuidora".
Cerveró foi mantido no cargo de diretor financeiro. Para ele, isso
ocorreu para que "não atrapalhasse os negócios conduzidos" por Collor na
estatal.
OUTRO LADO
O Instituto Lula informou nesta segunda que não iria se manifestar sobre
as declarações do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.
"Não comentamos vazamentos ilegais, seletivos e parciais de supostas
alegações que alimentam a um mercado de delações sem provas em troca de
benefícios penais", afirmou o instituto.
O Palácio do Planalto também não quis comentar. A Folha não conseguiu localizar os advogados nem a assessoria do senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL).
Em depoimento à Polícia Federal, o pecuarista José Carlos Bumlai
afirmou que pegou emprestado R$ 12 milhões do Banco Schahin em 2004
para repassar ao caixa dois do PT.
Bumlai relatou aos policiais que
metade desse valor foi destinado ao PT de Santo André, onde o partido
teria sido chantageado por um empresário, Ronan Maria Pinto, que teria
pedido R$ 6 milhões para não contar o que sabia sobre o caixa dois do
diretório local e a relação desses recursos com o assassinato do
prefeito Celso Daniel, ocorrida em 2002.
Os outros R$ 6 milhões foram enviados ao PT de Campinas para quitar dívidas de campanha, segundo a confissão de Bumlai.
O PT não se manifestou nesta segunda. Após as declarações de Bumlai, o
PT refutou que tenha recebido recursos ilegais do pecuarista e disse que
"todas as doações recebidas pelo PT aconteceram estritamente dentro da
legalidade e foram posteriormente declaradas à Justiça".
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