O pecuarista José Carlos Bumlai, o amigo de Lula que foi preso no final
de novembro pela Operação Lava Jato, contou em depoimento à Polícia
Federal que vai revelar "fatos ilícitos de que tem ciência" sobre a
construção da usina de Belo Monte.
Uma das revelações que Bumlai fez, segundo a Folha apurou, foi
que ele ajudou a configurar o primeiro consórcio que ganhou o leilão
para construir Belo Monte, mas não fez a obra por falta de capacitação
técnica.
Alan Marques/Folhapress | ||
O pecuarista José Carlos Bumlai durante depoimento à CPI do BNDES, em Brasília (DF), em dezembro |
Esse consórcio foi estimulado pelo governo do então presidente, Lula,
para pressionar as empreiteiras que haviam feito o estudo para construir
Belo Monte (Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Odebrecht), as quais
consideraram baixo demais o preço estimado para a obra.
O consórcio, que ganhou o leilão para a obra em 2010, era integrado por
empresas menores, como Queiroz Galvão, Mendes Junior e Cetenco, junto
com a Chesf (Companhia Hidro Elétrica do São Francisco).
As grandes empreiteiras chamavam esse grupo de "aventureiros".
Posteriormente, as grandes assumiram a obra, orçada em R$ 14 bilhões, em
valores de 2010. Vários delatores já contaram à PF que houve pagamento
de propina na obra de Belo Monte, para políticos do PT e do PMDB.
Os fatos narrados por Bumlai permanecem em sigilo porque vão fazer parte de um novo inquérito da PF.
Bumlai decidiu confessar irregularidades depois de ser preso pela Lava
Jato, para tentar obter uma pena menor. Ele já assumiu que fez um
empréstimo de R$ 12 milhões em seu nome, em 2004, mas que o dinheiro era
para o caixa dois do PT, o que o partido nega.
LOBBY
Bumlai narrou em novo depoimento, o qual se tornou público nesta quarta
(23), que ajudou a marcar uma reunião em 2014 entre o ex-presidente Lula
e o embaixador do Qatar porque tinha interesse em vender a sua usina de
álcool para uma empresa daquele emirado do Oriente Médio.
Em interrogatório anterior, o pecuarista disse que jamais tratou de
negócios com o ex-presidente. A omissão levou o delegado Filipe Hille
Pace a escrever no depoimento que Bumlai "continua a mentir e omitir
sobre fatos relevantes para a investigação".
Bumlai queria vender a usina porque seu grupo empresarial de Bumlai,
chamado São Fernando, está em recuperação judicial desde abril de 2013,
com dívidas de R$ 1,2 bilhão. A Folha revelou nesta quarta (23) que o
BNDES pediu a falência "imediata" das empresas de Bumlai porque não
recebe nada delas há um ano. A dívida de Bumlai junto ao BNDES soma R$
300 milhões.
Em email apreendido pela PF, de 21 de fevereiro de 2014, Bumlai escreveu
o seguinte ao secretário da embaixada do Qatar: "Estive hoje tratando
do assunto, e o ex-presidente Lula volta dia 27 de fevereiro para o
Brasil e marcará a data conforme solicitado no email da embaixada, ou
seja, antes de 19 de março".
O pecuarista relata algumas peculiaridades de sua amizade com Lula, a
quem conheceu em 2002, quando emprestou sua fazenda no Mato Grosso do
Sul para a gravação de um programa para a campanha eleitoral.
Segundo o pecuarista, Lula "nunca possuiu um número de celular próprio".
Quando queria falar com o ex-presidente, Bumlai disse que ligava para
Marisa Letícia Lula da Silva, a mulher de Lula.
Ele negou ao delegado que tenha exercido as funções de "secretário" de
Lula. Bumlai contou que quando recebia demandas relacionadas ao
ex-presidente, as repassava para Clara Ant, diretora do Instituto Lula e
responsável pela agenda do ex-presidente.
Procurado, o Instituto Lula não quis se pronunciar.
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