Pegou
mal. Não foi ninguém da imprensa golpista nem da oposição retrógrada.
Foi Marta Suplicy quem disse cobras e lagartos de Dilma, do governo e do
PT. Foi Marta quem, numa entrevista à repórter Eliane Cantanhêde, desancou companheiros como Aloizio ‘Inimigo’ Mercadante e Rui ‘Traidor’
Falcão. Foi Marta quem declarou ter participado de conversas nas quais o
próprio Lula, “extremamente incomodado” com Dilma, a “decepava”. Foi
Marta quem sentenciou: “Ou o PT muda ou acaba”.
Ninguém deseja
fazer intriga, mas Marta chegou ao ponto de elogiar a nova equipe
econômica liderada pelo tucano ortodoxo Joaquim Levy: “É experiente,
qualificada”. Noutros tempos, o PT chamava pra briga. Sobretudo porque
Marta condicionou o sucesso do governo na economia à disposição de Dilma
de não confundir Levy com Guido Mantega: “Se não respeitar, vai ser
desastroso.”
Pessimista, Marta acha que Dilma não conseguirá
enxergar no espelho as culpas da antecessora: “Agora, é preciso ter
humildade e a forma de reconhecer os erros a esta altura é deixar a
equipe [econômica] trabalhar. Mas ela não reconheceu na campanha, não
reconheceu no discurso de posse. Como que ela pode fazer agora?” Mais um
pouco e a companheira adere ao coro do “estelionato eleitoral”.
Para
o PT, só há dois tipos de seres humanos: o petista e o idiota. Vem daí a
convicção do petismo de que todas as críticas ao governo e ao partido
são suspeitas. Mesmo as opiniões negativas de aparência mais sensata têm
essa falha de origem: são de idiotas. De repente, surge um terceiro
tipo de ser humano: Marta Suplicy —uma quase ex-petista transitando da
militância dogmática, movida à base de fé e revelações divinas, para a
idiotia plena, que convive com a dúvida e a crítica.
Marta já não
consegue percorrer o noticiário sem fazer cara de nojo: “Cada vez que
abro um jornal, mais fico estarrecida com os desmandos. É esse o partido
que ajudei a criar?”. Ela reconhece que, no ano passado, fez muita
força para que Lula fosse o candidato do PT à Presidência. Acha que ele
chegou a flertar com a ideia. Só não brigou com Dilma, por achar que
ambos perderiam com a discórdia.
Perguntou-se a Marta se Lula pode
ajudar Dilma caso o governo volte a tropeçar na economia. E ela: “Você
não está entendendo. O Lula está fora, está totalmente fora.”
Acrescentou: “O Mercadante é inimigo, o Rui traiu o partido e o projeto
do PT, e o partido se acovardou ao recusar um debate sobre quem era
melhor para o país, mesmo sabendo das limitações da Dilma. Já no
primeiro dia, vimos um ministério cujo critério foi a exclusão de todos
que eram próximos do Lula. O Gilberto Carvalho é o mais óbvio.”
E
quanto a 2018? “Mercadante mente quando diz que Lula será o candidato.
Ele é candidatíssimo e está operando nessa direção desde a campanha,
quando houve um complô dele com Rui e João Santana para barrar Lula.”
Quando
a situação parecia caminhar para a anormalidade de sempre —o pastor
George Hilton cuidando do Esporte; o filho do Jáder na Pesca; o Levy
afiando a tesoura; as ações da Petrobras negociadas na bacia das almas;
os empreiteiros em cana, o PMDB às turras com o Planalto; o Imperador
retirado do esquife na novela das nove…— quando tudo voltava para a
anormalidade de praxe, vem a Marta Suplicy torcer o nariz da Dilma e
cuspir no prato do PT.
Espantosa fase essa que o PT atravessa. O
absurdo adquiriu para o partido uma doce, uma persuasiva natudalidade.
Os petistas se espantam cada vez menos. Se o banquete inclui ensopadinho
de dinheiro sujo à moda de Valério, nenhum petista fará a concessão de
uma surpresa. Adicionaram-se as propinas do petrolão no cardápio? Pois
que seja propina, e com abóbora.
Ao desenhar um quadro devastador
da legenda, Marta Suplicy apenas reintroduz nos seus hábitos o ponto de
exclamação. Faz isso com um atraso hediondo. Marta demorou tanto para
acordar que acabou perdendo o essencial. “Ou o PT muda ou acaba”, disse
ela. Ora, o PT já acabou faz tempo. Só Marta não notou que isso que está
aí na praça é um ex-PT bem mequetrefe.
Aquele partido casto e
imaculado da década de 80 morreu. Saiu da vida para cair na esbórnia. A
julgar pelo relato de Marta, o cadáver encontra-se em avançado estágio
de decomposição. O pior é que a convocação de Joaquim Levy para fazer o
inventário mostra que a velha legenda morreu endividada. E não foi para o
céu.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
POLÍTICA E ECONOMIA