Ainda não é possível estimar o nível e as consequências da
desmoralização de PT e PSDB, se por mais não fosse porque seus governos
principais começam a se esboroar apenas agora.
Ou melhor, seus escombros
apenas começam a cair na cabeça da pessoa comum das ruas.
Apesar da desordem que a falta d'água e luz pode causar, a catástrofe é
incerta. Mesmo racionamentos duros podem causar raiva cotidiana difusa,
mas não explosiva. Parte de seus efeitos talvez apareça de modo
indireto, como economia ainda mais lerda, em vez de colapso generalizado
e agudo.
No apagão de 2001, não houve breu. A crise se traduziu em perdas de
pontos do PIB (quatro ou cinco, em dois anos), desgraça que, porém, não
afeta todos e quaisquer de modo concreto, cotidiano e revoltante.
Pelo menos ainda não há colapso socioeconômico, apesar da administração
econômica ruinosa dos últimos quatro anos. Ao contrário. Os colchões
sociais criados nos anos petistas existem como nunca antes neste país. O
desemprego aumentará em 2015, mas a taxa ainda estaria entre as quatro
mais baixas em vinte anos ou mais.
Nos fatos nus, não há crise aí, por mais que o relativo conforto no
mundo do trabalho derive de gastos e políticas que se esgotaram,
estouraram as contas públicas e produziram um equilíbrio ruim. Isto é, o
crescimento do número de trabalhadores tem sido pequeno, nulo nas
metrópoles, e se dá cada vez mais por ocupações de baixa produtividade e
salários.
Programas bancados por meio de dívida pública contribuíram para manter
baixo o desemprego. Por exemplo, subsídios para empresas (juro quase
zero) e gastos tributários ("desonerações"). Aumento rápido de gastos
sociais e salários, em especial do mínimo (tais aumentos permitiram que
um mais integrantes das famílias se retirassem do mercado de trabalho).
Aumento do crédito via bancos públicos. Protecionismo.
A injeção de doses extras desses anabolizantes causaria danos colaterais críticos e imediatos. Até Dilma Rousseff percebeu.
A renda das famílias cresceu mesmo em 2014 mais que a economia. Mas o
ritmo das melhorias tende a zero desde o ano passado. Virá a segunda
fase da recessão, com o "ajuste". O Petrolão nem estourou de vez.
Os estelionatos dos governos federal e paulista, além da corrupção
ciclópica, causam escárnio, cinismo ou nojo deprimido entre elites
diversas, petistas, tucanas, neutras ou indiferentes a partidos. Mas
nada sabemos como o grosso do povo ou os centros nervosos e neuróticos
do país (como São Paulo) vão reagir à primeira crise socioeconômica
duradoura dos anos petistas, de resto simultânea a um pico alto de
desfaçatez dos governantes e à degradação íntima da vida cotidiana.
De resto, apesar dos colchões sociais, as expectativas de melhorias
foram infladas neste século, por melhoras reais e promessas exageradas e
ignorantes.
Nem sabemos o que fazer da provável revolta, maior ou menor. Não temos
Syriza, Podemos ou mesmo neofascistas, alternativas europeias que
brotaram de uma crise que ainda não vivemos. Afora PT e PSDB, em
putrefação, há PMDBs e nenhum movimento social ou político grande ou em
formação para captar e dar forma à onda de indignações.
Vinicius Torres Freire está na Folha desde 1991. Foi
secretário de Redação, editor de 'Dinheiro', 'Opinião', 'Ciência',
'Educação' e correspondente em Paris. Em sua coluna, aborda temas
políticos e econômicos. Escreve de terça a sexta e aos domingos
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POLÍTICA E ECONOMIA