Astrônomos amadores descobriram estranhas nuvens em Marte, muito mais
altas que as que costumam aparecer no planeta vermelho. Sua natureza
até agora é desconhecida e intriga os cientistas.
O achado, publicado online ontem pela revista científica britânica “Nature”,
mostra duas coisas importantes: uma é que os mistérios marcianos
parecem não se esgotar nunca. Outra é que a astronomia amadora continua a
ter um papel na linha de frente da ciência.
Marte é monitorado com atenção ao telescópio por centenas de anos.
Contudo, ninguém havia visto nada parecido com o que diversos astrônomos
amadores observaram em março de 2012. Eles notaram uma protuberância no
limbo do planeta (a borda visível dele), algo como uma nuvem bem
distante da superfície marciana.
O fenômeno só era perceptível desse ângulo. Não conseguiram notá-lo
nem do outro lado do limbo, depois que o planeta dava meia volta em
torno de si, nem quando a região sobre a qual a nuvem se projetava
estava de frente para o telescópio — no caso, a área conhecida como
Terra Cimmeria. Contudo, após uma volta completa do planeta, lá estava a
nuvem novamente. Ela durou por vários dias, sumiu, e algo parecido
voltou a ser observado em abril, durante outros dez dias.
EM BUSCA DE RESPOSTAS
Baseando-se nas observações feitas pelos amadores, a equipe de Agustin Sánchez-Lavega, da Universidade do País Basco, em Bilbao, na Espanha, passou a investigar o caso.
Escarafuncharam antigas imagens feitas em
observatórios profissionais, assim como em sondas enviadas a Marte, mas
não tiveram sucesso em ver outras instâncias do fenômeno — salvo numa
sequência de imagens do Telescópio Espacial Hubble obtida em 17 de maio
de 1997.
Pela análise das imagens das ocorrências de 2012, Sánchez-Lavega e
seus colegas concluíram que as estranhas nuvens aparecem a uma altitude
de 200 a 250 quilômetros e passam por mudanças que as fazem desaparecer
conforme transitam pelo lado não-iluminado do planeta, para depois
voltar a se formar sob a luz do Sol.
A altitude é completamente inesperada. Para que se tenha uma ideia,
250 km não é muito diferente da órbita adotada pela Estação Espacial
Internacional (que em sua aproximação máxima da Terra fica a 330 km do
chão). Os pesquisadores testaram diversos modelos baseados em partículas
de gelo de dióxido de carbono ou de água, e eles poderiam explicar o
fenômeno (poeira não faria o mesmo serviço). Alternativamente,
poderíamos estar vendo algum fenômeno ligado a auroras — há uma anomalia
magnética forte naquela região do planeta.
Contudo, ambas as explicações não casam com o que sabemos da
atmosfera superior marciana. Algo está fora da ordem. Agora é hora de os
cientistas quebrarem a cabeça para compreender o que estão vendo.
Talvez para alguns isso soe frustrante — depois de décadas de
exploração na superfície e na órbita de Marte, ainda somos surpreendidos
por fenômenos desconhecidos que podem ser vistos do quintal de casa com
um telescópio. Onde fica a tão badalada competência científica nessa
hora?
Para o Mensageiro Sideral, é justamente o contrário.
A ciência não é só a busca por respostas. É também a busca por novas
perguntas. No que diz respeito a Marte, estamos com sorte: acabamos de
encontrar mais uma.
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