Seguranças receberam quase mil diárias do Planalto para ficar 283 dias em imóvel que ex-presidente afirma ser de "amigos" - embora a Odebrecht, empreiteira do petrolão próxima do petista, tenha custeado R$ 700 mil em reformas no local
FILIPE COUTINHO
01/02/2016 - 16h26 - Atualizado 01/02/2016 16h34
Relatórios de viagem produzidos pelo Palácio do Planalto revelam que o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva contou com sua segurança pessoal
por 111 vezes em Atibaia, entre 2012 e 11 de janeiro deste ano. É nas
matas de Atibaia, no interior de São Paulo, que fica o sítio Santa
Bárbara, no qual a Odebrecht gastou R$ 700 mil em reformas. No papel, o
sítio está em nome de um amigo de Lula e do sócio de um dos filhos dele -
Fábio Luís, aquele que enriqueceu graças à parceria empresarial com a
telefônica Oi. Lula nega ser dono do sítio e disse, por meio de
assessoria, frequentar o local somente em “dias de descanso”. As
evidências obtidas por ÉPOCA, porém, confrontam fortemente a versão do
ex-presidente. A cada cinco dias, um segurança de Lula era deslocado
para Atibaia. Quem visita sítio de amigos com tamanha frequência?
ÉPOCA mapeou os dados a partir das diárias dos sete servidores que
fizeram parte da equipe de segurança do ex-presidente. No total, eles
receberam 968 diárias da presidência, custando R$ 189 mil. Os dados
mostram que, em muitos casos, os seguranças tiveram de alternar turnos
em Atibaia, como forma de garantir que assim sempre estivesse alguém na
cidade num determinado período. Se, por exemplo, um segurança ficou de
segunda-feira a quinta-feira, e outro chegou na quarta-feira e ficou até
sábado, ÉPOCA contabilizou apenas uma viagem, de segunda a sábado. O
itinerário é quase sempre o mesmo: São Bernardo do Campo (onde Lula
mora), Atibaia e retorno para a mesma cidade.
A versão de Lula para o caso do sítio é clara. Segundo a assessoria de
imprensa de Lula, "o ex-presidente Lula e também Dona Marisa, frequentam
em dias de descanso um sítio de propriedade de amigos da família na
cidade de Atibaia". ÉPOCA questionou o Instituto Lula sobre as viagens
dos seguranças a Atibaia, mas a assessoria não fez comentários. Disse
que "tentativa de associá-lo a supostos atos ilícitos tem o objetivo mal
disfarçado de macular a imagem do ex-presidente".
Para fazer essas 111 viagens, os seguranças de Lula pernoitaram um
total de 283 vezes em Atibaia. O período total dos documentos é de cerca
de 1400 dias _ as datas na cidade representam cerca de 20%. Em junho e
julho de 2014, por exemplo, os seguranças de Lula passaram seis finais
de semanas seguidos na cidade do sítio. há casos em que as idas a
Atibaia representam quase a metade de todas as viagens feitas por um
segurança de Lula.
Fora do país
Como todo ex-presidente, Lula tem por direito contar com segurança e assessores. A lei, contudo, não estende esse benefício a familiares. ÉPOCA cruzou as viagens dos segurança a Atibaia com dados produzidos pela Polícia Federal sobre entradas e saídas do país por Lula, material que integra a investigação do Ministério Público Federal sobre tráfico de influência internacional.
Em seis datas, os seguranças de Lula estão em Atibaia enquanto o
ex-presidente ou estava retornado ou deixando o país. Às 7h57 do dia 13
de março de 2013, a PF registrou a saída de Lula do país. Ele começava
ali um tour pela África. Naquele mesmo dia 13, o militar Elias dos Reis
deixava São Bernardo, rumo a Atibaia. Recebeu de diária R$ 265, voltando
a São Bernardo no dia seguinte. Enquanto Lula estava na África, o
Planalto assim registrou a viagem a Atibaia: “Compor a equipe de
segurança do Sr Ex-Presidente da República”. O que um segurança do
ex-presidente fazia em Atibaia enquanto Lula estava na África?
As diárias estão disponíveis a partir de 2012. A primeira ida
registrada é em 30 de março de 2012. Naquele ano, as viagens eram
curtas. Em 14 ocasiões, foi apenas um bate volta, sem pernoite. A
frequência começa a se intensificar ao longo dos meses, chegando ao auge
em julho de 2014 _ era a Copa do Mundo. Lá, os seguranças de Lula
estiveram presentes nas partidas contra Chile e Colômbia, na fase final
do torneio. Depois, ficaram o maior período no sítio. A partir do dia 17
de julho, por onze dias seguidos algum segurança presidencial esteve
presente em Atibaia.
As visitas mais recentes foram no começo do ano. Os seguranças de Lula
passaram o réveillon de 2016 em Atibaia e, depois, ficaram por lá de
quinta-feira, dia 7, a segunda-feira, dia 11. Nos documentos do
Planalto, há casos em que os seguranças tiveram que registrar as viagens
depois do ocorrido. Isso porque, segundo os assessores, a viagem foi
feita em cima da hora. “O servidor viajou para atender a demanda da
agenda do ex-presidente Lula. E devido a urgência no atendimento não foi
possível enviar o SCDP [registro] antes da ocorrência da respectiva
viagem”, diz um dos registro.
Os dados denotam que a frequência de Lula em Atibaia pode ser maior do
que a visita a amigos donos do sítio, como ele já admitiu em nota à
imprensa. Os donos do sítio são dois sócios do filho de Lula, Fábio
Luís. Segundo a Folha de S. Paulo, fornecedores da obra disseram que o
sítio foi reformado pela Odebrecht.
ÉPOCA
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