A Polícia Federal de São Paulo deflagrou nesta terça-feira (28) a
Operação Boca Livre, que investiga desvio de R$ 180 milhões de recursos
federais em projetos culturais aprovados junto ao Ministério da Cultura
com benefícios de isenção fiscal, previstos na Lei Rouanet.
Policiais federais e servidores da Controladoria Geral da União cumprem
14 mandados de prisão temporária e 37 mandados de busca e apreensão em
São Paulo, Rio de Janeiro e no Distrito Federal. Eles foram expedidos
pela 3ª Vara Federal Criminal em São Paulo.
Entre os alvos de busca está o Grupo Bellini Cultural, que atua há 20
anos no mercado e aparece como o principal operador do esquema. Também
são citados o escritório de advocacia Demarest e as empresas Scania,
Kpmg, Roldão, intermédica, Laboratório Cristalia, Lojas Cem, Cecil e
Nycomed Produtos Farmacêuticos.
Segundo a PF, "há indícios de que as fraudes ocorriam de diversas
maneiras, como a inexecução de projetos, superfaturamento, apresentação
de notas fiscais relativas a serviços/produtos fictícios, projetos
simulados e duplicados, além da promoção de contrapartidas ilícitas às
incentivadoras".
A investigação constatou que eventos corporativos, shows com artistas
famosos em festas privadas para grandes empresas, livros institucionais e
uma festa de casamento foram custeados com recursos públicos.
De acordo com investigadores, Antonio Carlos Belini Amorim usou recursos
públicos para pagar despesas do casamento de um familiar. A festa de
luxo aconteceu na praia Jurerê Internacional, em Florianópolis. Na casa
dele, foi apreendida uma BMW.
"O nome Boca Livre é genial. Vimos nessa madrugada a gravação de um
vídeo de um casamento, uma festa boca livre que nós pagamos", disse o
ministro da Justiça Alexandre de Moraes, em coletiva de imprensa na
manhã desta terça.
"Foi num hotel cinco estrelas em Florianopólis. Achamos que tivessem
sido contratados modelos para fazer o vídeo, mas não, eram os convidados
tomando champanhe."
O inquérito policial foi instaurado em 2014, depois que a PF recebeu
documentação da Controladoria Geral da União de desvio de recursos
relacionados a projetos aprovados com o benefício fiscal.
Além das 14 prisões, o MinC (Ministério da Cultura) é alvo das buscas.
A Polícia Federal também solicitou a Justiça que inabilitasse algumas
pessoas jurídicas para propor projetos junto ao o MinC e à Secretaria da
Cultura do Estado de São Paulo. A operação realizou o bloqueio de
valores e o sequestro de bens como imóveis e veículos de luxo.
Os presos responderão pelos crimes de organização criminosa, peculato,
estelionato contra União, crime contra a ordem tributária e falsidade
ideológica. As penas podem chegar a até doze anos de prisão.
LABORATÓRIO DE COMBATE À CORRUPÇÃO
A operação Boca Livre foi a primeira realizada com o Laboratório de
Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro de São Paulo - LAB-LD, que
fez o cruzamento e a análise de dados e informações.
As ferramentas do laboratório permitiram a coleta de dados de pessoas e
empresas investigadas e a identificação dos relacionamentos entre elas,
apontando os indícios de crimes.
O LAB-LD será utilizado também na análise do material ora apreendido pela Polícia Federal
ENTENDA A LEI ROUANET
O que é a Lei Rouanet?
Sancionada pelo presidente Fernando Collor em 23 de dezembro de 1991, a
lei 8.313 instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura, que
implementou mecanismos de captação de recursos para o setor cultural. Um
deles é o incentivo à cultura, ou mecenato (que popularmente ficou
conhecido como Lei Rouanet).
Como funciona o incentivo cultural?
O governo federal permite que empresas e pessoas físicas descontem do
Imposto de Renda valores diretamente repassados a iniciativas culturais,
como produção de livros, preservação de patrimônios históricos,
festivais de música, peças de teatro, espetáculos de circo, programas
audiovisuais etc. Ou seja, em vez de pagar o imposto da totalidade, você
reverte parte dele a um projeto cultural.
Quanto as empresas e pessoas físicas podem destinar a projetos aprovados na Rouanet? E quanto podem deduzir do Imposto de Renda?
Os incentivadores podem ter até o total do valor desembolsado deduzido
do imposto devido. Mas há limite: empresas com lucro real podem abater
até 4% do imposto devido; pessoas físicas, até 6%.
Assim, uma companhia que deve pagar R$ 1 milhão de Imposto de Renda pode
redirecionar a um projeto aprovado na Lei Rouanet até o valor de R$ 40
mil. Já uma pessoa que paga, digamos, R$ 10 mil de imposto pode deduzir
até R$ 600.
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POLÍTICA E ECONOMIA