quarta-feira, 8 de junho de 2016

O circo pegou fogo

A Lava-Jato desmantelou o PT, continuou sua marcha e chegou ao braço tradicional e onipotente da oligarquia

A Lava-Jato corroeu a presidência petista de Dilma Rousseff, está perto de chegar em Lula, botou na cadeia José Dirceu e João Vaccari, ex-presidente e ex-tesoureiro do PT. Com o pedido de prisão para José Sarney, Renan Calheiros, Eduardo Cunha e Romero Jucá, o procurador-geral Rodrigo Janot levou a faxina para os salões do PMDB. 


Desde 2014, quando a operação começou, a oligarquia nacional cultiva a fantasia de que ela seria paralisada por poderosos interesses. Enganou-se em todos os casos. Ela não chegaria à Odebrecht. Chegou. Não prenderia o doutor Marcelo. Prendeu. Ele não falaria. Falou. O impensável aconteceu e continuará acontecendo porque as forças poderosas tornaram-se impotentes.

Em 1996, Sérgio Moro tinha 24 anos, formara-se em Direito pela Universidade Estadual de Maringá e foi aprovado num concurso para juiz federal. No Banco Central trabalhava o advogado Teori Zavascki. Havia sido aprovado num concurso para juiz, mas preferira continuar por algum tempo no BC. 

Em março daquele ano, no meio de uma crise provocada pela quebra do Banco Econômico e da ameaça de instalação de uma CPI, o presidente Fernando Henrique Cardoso registrou em seu diário:
“O Ângelo Calmon de Sá [dono do Econômico] teria dito que na CPI diria tudo o que sabe sobre o PFL [atual DEM] no Nordeste, veja o clima que se está criando. Esta gente está brincando com fogo.”

(Uma pasta rosa encontrada no gabinete de Calmon de Sá expusera a contabilidade secreta das doações de bancos a candidatos. Sem lê-la direito, um poderoso hierarca do Banco Central vazou seletivamente parte de seu conteúdo. Deu-se mal.)

Na mesma época aconteceu um telefonema do governador de São Paulo, Luiz Antonio Fleury, sempre girando em torno da CPI, e FHC registrou:
“Haverá os dossiês que existem no Banco Central sobre deputados e senadores, eles vão aparecer, haverá uma lavagem de roupa suja, isso vai pôr fogo no circo”. 

O circo reaparece na narrativa do FHC um ano depois:
“O Maluf telefonou para ele [o ministro da Articulação Política, Luiz Carlos Santos] para dizer que, se essa coisa da CPI dos Precatórios for adiante, ele vai botar fogo no circo; vai ver o negócio de financiamento de campanha, que ele sabe como são os financiamentos, que ele não vai morrer sozinho.” 

Para alegria dos palhaços que pagavam as festas de Ângelo Calmon, Fleury e Maluf, o circo está pegando fogo. Sérgio Moro e Teori Zavascki não são piromaníacos. Apenas pediram à oligarquia que mostrasse suas cartas, expuseram o blefe do andar de cima e acabaram com a mágica.

Sérgio Machado chegou aos cofres da Transpetro no consulado petista, mas sua militância vem do PMDB e do PSDB. Seu pai, o cearense Expedito Machado, foi ministro da Viação de João Goulart, exilou-se e foi um dos primeiros a retornar ao Brasil. Ao pé da escada do avião que o trouxe ao Rio, recebeu a escolta do seu conterrâneo Armando Falcão, poderosa vivandeira do novo regime. Passou pela polícia sem ser incomodado.

A teoria do circo pegando fogo é recorrente nas conversas grampeadas por Machado. Essa circunstância (o grampo) deveria inibir os movimentos dos poderosos da nova ordem. A colheita no vinhedo petista continua, mas agora a Lava-Jato chegou às velhas videiras francesas.

Elio Gaspari é jornalista


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