Surge a primeira prova material de que partia da sede do governo a ordem para achacar empresas durante a campanha de Dilma Rousseff
Em 7 de agosto de 2014, executivos de uma das maiores agências
de publicidade do mundo, a Borghi Lowe, discutiam o que fazer diante de
uma situação delicada. A campanha presidencial estava no início. Uma
pesquisa divulgada naquele dia mostrava que a disputa entre a petista
Dilma Rousseff e o tucano Aécio Neves seria acirrada. A angústia de
Valdir Barbosa, vice-presidente da Borghi Lowe, no entanto, decorria de
outra encrenca. Ele e um colega da agência, Ricardo Hoffmann,
representante da Borghi Lowe em Brasília, tinham sido convocados para
uma reunião sigilosa com um diretor da Caixa Econômica Federal, Clauir
Santos, responsável pelo marketing do banco. Ouviram dele um pedido de
dinheiro, não para ele mesmo, mas para a campanha eleitoral do PT. E o
pedido não partira do tesoureiro do partido ou da campanha. Clauir
Santos disse que estava cumprindo ordens do Palácio do Planalto.
Em 2014, a Borghi Lowe era uma das quatro agências encarregadas da
conta publicitária da Caixa Econômica, um butim excepcional de 560
milhões de reais, um dos maiores contratos do governo na área. Antes de
qualquer providência, Valdir Barbosa preferiu consultar seu superior,
Michael Wall, que fica em Londres. Em um e-mail, escrito em inglês,
informou: “O diretor-presidente da Caixa foi chamado ao Palácio do
Planalto e solicitado a ‘pedir aos fornecedores da Caixa que fizessem
contribuições políticas ao partido do governo (PT)’”. Em seguida,
comentou o incômodo da situação: “O próprio diretor-presidente, que
trabalhou como servidor público durante toda a sua carreira
profissional, se sentiu completa e totalmente constrangido e
desconfortável com tal solicitação”. Na época, o diretor-presidente da
Caixa era Jorge Hereda, que deixou o cargo no início do segundo mandato
de Dilma. Hereda tem mais de trinta anos de serviço público.
Na mesma mensagem, Valdir Barbosa ressaltou ter informado a Clauir
Santos, diretor de marketing da Caixa, que as normas da Borghi Lowe
proibiam “contribuições políticas”, ao que o funcionário retrucou
lembrando que as outras três agências aceitariam o “convite”. Era uma
insinuação de que a Borghi Lowe poderia sofrer algum tipo de retaliação
no futuro caso virasse as costas às necessidades do PT. Escreveu
Barbosa: “Expliquei ao Clauir o conteúdo da Política Anticorrupção e
disse a ele que nós somos absolutamente proibidos de fazer este tipo de
contribuição ou qualquer contribuição semelhante a esta. Ele obviamente
lembrou-nos que provavelmente as três outras agências deveriam aceitar o
‘convite’ e fazer contribuições, ao que eu repliquei que elas eram
agências 100% brasileiras e que, portanto, podiam fazer o que quisessem
sem consultar ninguém”. Mesmo constrangido, Clauir tentou justificar que
havia “base legal” à contribuição. A Borghi Lowe é brasileira, com um
sócio estrangeiro, mas, pela legislação da época, poderia, de fato,
fazer contribuições eleitorais, desde que legais. Mas esse não era o
caso, segundo suspeitam os envolvidos na investigação.
Em poder da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, a mensagem obtida
por VEJA é a evidência mais contundente até o momento de que o Palácio
do Planalto atuou como uma central de arrecadação de recursos ilegais
para o caixa dois do PT e, para tanto, constrangia graduados servidores
públicos a trabalhar como achacadores. A mensagem pode ser mentirosa,
uma invenção do vice de uma agência de publicidade? Até pode, por mais
estranho que seja, mas os investigadores também acham que não é o caso.
“Um pedido de doação legal jamais seguiria aqueles trâmites. Todos
sabiam que a nossa política interna não autorizava contribuições ou
doações a partidos políticos”, explica um dos envolvidos no caso.
Eles acreditam que a ordem veio mesmo do Planalto e o dinheiro era
mesmo para o caixa dois porque já comprovaram que havia uma intimidade
criminosa entre a Borghi Lowe e braços do governo. A mensagem integra
uma investigação sigilosa que começou em abril de 2015, quando a polícia
prendeu seis pessoas, entre elas o publicitário Ricardo Hoffmann,
representante da Borghi em Brasília, e o ex-deputado petista André
Vargas. Alvo de uma devassa, a agência de publicidade decidiu negociar
um acordo de leniência, que está estranhamente parado há um ano na
Controladoria-Geral da União. Já encaminhou ao Ministério Público
e-mails, notas fiscais e balanços nos quais se constata que havia uma
parceria clandestina para fraudar licitações.
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POLÍTICA E ECONOMIA